Autistas querem sua voz nas pesquisas

Autistas

Escrito por Sigla Educacional

16 de maio de 2023

Autistas querem sua voz nas pesquisas

Estima-se que cerca de 1% da população possa ser autista, segundo estimativas globais da ONU. Segundo dados do IBGE existem cerca de 2 milhões de autistas no Brasil. Ainda que hoje a neurodiversidade seja melhor aceita, quem de fato se importa com a causa quer que sua voz seja ouvida para que as prioridades clínicas e científicas sejam atendidas.

Hoje é cada vez mais comum que pais ou parentes de crianças diagnosticadas no espectro do autismo recebam, elas próprias, o diagnóstico de autismo. É, laranja não nasce em bananeira. A Força-tarefa Global de Autismo em Pesquisa em Autismo (GATFAR) é uma força tarefa internacional focada em moldar a agenda de pesquisas sobre o autismo, com pesquisas direcionadas ao que, de fato, importa para essa população.

O grupo GATFAR é composto por autistas, médicos, terapeutas e advogados que desejam ajudar a mudar a forma como médicos e terapeutas lidam com as pessoas diagnosticadas no espectro pois acreditam que, se as mudanças não acontecem no meio acadêmico, não há mudanças em local algum. Foi formado em 2022 e se somou a um imenso coro de defensores da causa que levantam a bandeira que as pesquisas científicas não atendem à demanda das pessoas no espectro e, muitas delas, muito pelo contrário, causam dor. Segundo Heini Natri, cientista computacional do Translational Genomic Reserch Institute em Los Angeles e membro do GATFAR, a agenda de pesquisa não é definida pelo bem estar ou interesse das pessoas autistas.

Segundo essa comunidade, ainda que seja crescente a conscientização sobre o autismo e a aceitação da neurodiversidade, grande parte da academia trabalha o espectro como um problema a ser resolvido, com traços e características a serem eliminados, adotando, em seu lugar, comportamento neurotípicos. A comunidade que apoia a causa deseja serviços e programas que apoiem pessoas com autismo.

O debate foi reacendido em 2021 quando, em um relatório, o The Lancet estabeleceu como prioridade pesquisas clínicas com foco em medicamentos e terapias comportamentais. Para fecharem com chave de ouro chamaram de “autismo profundo” pessoas autistas que requerem cuidado permanente, que não falam ou são minimamente verbais ou que tem deficiência intelectual. O grupo de defensores acredita que pessoas com autismo, e suas famílias, que não falam ou que tem rebaixamento intelectual correm o risco de serem abandonados e deixados para trás e esquecidas. O temor dos defensores é que tal fala afaste os jovens cientistas do campo.

A luta é para que as pesquisas não desumanizem, objetifiquem e estigmatizem os autistas. É importante pensarmos que estudos apontam que autistas morrem, em média, 16 anos antes da população em geral, principalmente por suicídio. Para os com deficiência intelectual, esse número foi de 30 anos. Segundo Botha, as pesquisas continuamente descrevem autistas com termos subumanos, permitindo, assim, um tratamento subumano. E foi essa linguagem desumanizante que permeou e moldou a pesquisa sobre o autismo por décadas.

No final de 2022 Botha foi coautora de um estudo que entrevistou cerca de 200 cientistas que teve como tema de pesquisa o autismo. Pasmem: quase 60% deles mostraram, sem nenhum pudor ou vergonha, pontos de vista absolutamente capacitistas que carregam a desumanização, estigmatização e objetificação dos autistas.

O que o grupo de defensores deseja? Eles querem ser ouvidos, querem pesquisas que, de fato, melhores sua qualidade de vida. Os autistas querem estudos que incluam, por exemplo, epilepsia, dor gastrointestinal, deficiência intelectual e problemas de sono. Ao invés disso, a maior parte do financiamento vai para estudos sobre fatores de risco genéticos e ambientais, tratamentos e intervenções sem, claramente, dizer ou indicar como as pesquisas beneficiaram as pessoas autistas.

O único caminho a seguir, segundo Kripke-Ludwig, é abrir espaço para mais pessoas autistas na academia, ainda que haja desconforto. O autista não é uma versão quebrada do normal. Segundo Krimpke-Ludwig: “Sou autista, deficiente e fabuloso. Acostume-se com isso”.

www.siglaeducacional.com.br

Você pode gostar também

Ruído branco indutor de sono para recém-nascidos?

Ruído branco indutor de sono para recém-nascidos?

Ruído branco indutor de sono para recém-nascidos: mocinhos os vilões? Sempre achei fantástico pensar que a audição não pode ser desligada, não funciona como a visão que, caso não queríamos ver determinada cena, simplesmente fechamos os olhos e eliminamos a indesejada...

ler mais
Nipah vírus, a volta daquele que nunca se foi

Nipah vírus, a volta daquele que nunca se foi

Nipah vírus, a volta daquele que nunca se foi Antes de entendermos a nova presença do vírus, vamos entender o que é o Nipah Vírus. O Nipah Vírus é transportado por morcegos frugívoros, conhecidos como raposas voadoras. A descoberta desse vírus ocorreu em 1999 após um...

ler mais
Gripe aviária: nova pandemia humana?

Gripe aviária: nova pandemia humana?

Você sabia que a gripe aviária pode se tornar uma nova pandemia humana? Será que estamos preparados? Artigo recente da Revista Nature reforça a necessidade de toda comunidade estar atenta a esse novo risco. Com o aumento dos casos de gripe aviária em gado nos Estados...

ler mais
Escolhas alimentares e restaurantes barulhentos

Escolhas alimentares e restaurantes barulhentos

Está achando um absurdo essa informação? Está achando que deve ser impossível isso ser possível? Mas não é, nas últimas décadas pesquisadores tem se dedicado ao assunto e estudado qual é o impacto do som nas suas escolhas alimentares, que variam do tipo de música,...

ler mais
Apraxia de fala e atraso de linguagem

Apraxia de fala e atraso de linguagem

Saiu na CoDas: Apraxia de fala e atraso de linguagem: a complexidade do diagnóstico e tratamento em quadros sintomáticos de crianças Autoras: Melissa Catrini e Maria Francisca Lier-DeVitto O texto aborda a complexidade do diagnóstico e tratamento de distúrbios de fala...

ler mais
Vamos falar sobre nossa voz: quem é o dono?

Vamos falar sobre nossa voz: quem é o dono?

Quem é o dono da sua ou da minha voz? Na era da inteligência artificial, surgem situações que colocam em xeque as leis relativas aos direitos individuais. Tendo essa afirmação em mente, me responda, quem é o dono da voz? Essa dúvida veio à tona quando a atriz...

ler mais
Ozempic: mais um para conta

Ozempic: mais um para conta

Mais um para conta do Ozempic, redução do risco de insuficiência renal e morte em pessoas com diabetes Além de ajudar no controle da glicemia em pacientes com diabetes tipo 2 e auxiliar no processo de emagrecimento, os cientistas descobriram que a semaglutida, o...

ler mais
Vício em alimentos pode existir?

Vício em alimentos pode existir?

“Vício” em comida deve ser tratado como o abuso de drogas? Alguns estudos apontam que sim É possível ser "viciado" em alimentos não saudáveis? Sim, afirma um grupo de médicos e cientistas que desafia o aconselhamento médico tradicional, propondo uma nova abordagem...

ler mais
As inundações e nossa saúde

As inundações e nossa saúde

As inundações e nossa saúde Hoje é 13 de maio de 2024, o sul do país está submerso, milhares de pessoas estão desabrigadas morando em abrigos sem saber o dia de amanhã. Outras tantas não tiveram a sorte de serem socorridas e morreram em meio a esse desastre. O Brasil...

ler mais
Transtorno do Processamento Auditivo em adultos

Transtorno do Processamento Auditivo em adultos

Transtorno do processamento auditivo em adultos Pessoas com transtorno de processamento auditivo lutam para compreender e interpretar o mundo graças a problemas na forma como seus cérebros processam o som. Embora a maioria dos adultos com TPA seja diagnosticada na...

ler mais

0 comentários

Enviar um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *