O papel do folato (vitamina B₉) na prevenção do câncer colorretal: evidências epidemiológicas, mecanismos biológicos e o impacto na saúde pública
A cantora brasileira Preta Gil foi diagnosticada com câncer colorretal (CCR) em janeiro de 2023. Em agosto de 2024, a doença recidivou com metástases, levando-a a iniciar tratamento experimental nos Estados Unidos em 2025. Apesar das tentativas terapêuticas, Preta Gil faleceu em 20 de julho de 2025, aos 50 anos, em Nova York.
Sua trajetória trouxe visibilidade à importância do rastreamento precoce e da conscientização sobre o CCR, especialmente entre adultos mais jovens, um grupo em crescimento na estatística de casos. A comoção pública, que resultou em decretos de luto oficial no estado e na cidade do Rio de Janeiro, evidencia o impacto humano da doença. O caso de Preta Gil ilustra a importância do diagnóstico precoce e a necessidade de políticas públicas eficazes que incentivem a prevenção, o rastreamento e o acesso à informação.
O CCR é a terceira neoplasia mais comum no mundo e a segunda principal causa de morte por câncer. O folato, ou vitamina B₉, é essencial para a biossíntese de nucleotídeos, metilação do DNA e divisão celular — processos fundamentais para a manutenção da estabilidade genômica (Kim, 2007).
Evidência observacional
Meta-análise realizada por Gibson et al. (2011) avaliou dados de 27 estudos de coorte e caso-controle, indicando que a ingestão elevada de folato dietético está associada a menor risco de CCR (RR = 0,75; IC 95%: 0,64–0,89).
Outra meta-análise conduzida por Xu et al. (2021), com mais de 900 mil participantes, mostrou que um aumento de 100 μg/dia de folato dietético estava associado a uma redução progressiva do risco de CCR, especialmente até 500 μg/dia.
Em contraste, Vollset et al. (2013) analisaram 13 ensaios clínicos randomizados com mais de 49.000 participantes e observaram que a suplementação com ácido fólico em doses de 0,5 a 2,5 mg/dia não conferiu benefício significativo na prevenção do câncer colorretal (RR = 1,00; IC 95%: 0,82–1,22).
Suplementação e risco potencial
Ebbing et al. (2009), em estudo clínico na Noruega, apontaram aumento do risco de neoplasias em indivíduos que fizeram uso prolongado de suplementos contendo ácido fólico e vitamina B12. Este achado reforça a teoria do “efeito dual” do folato, discutido por Kim (2007), segundo o qual, enquanto o folato protege tecidos normais, pode estimular a proliferação de células pré-neoplásicas.
Mecanismos biológicos
- Síntese e reparo do DNA – O folato atua como coenzima na produção de nucleotídeos e na conversão de uracila em timina, prevenindo mutações (Kim, 2007).
- Metilação do DNA – Atua como doador de grupos metila via S-adenosilmetionina, regulando a expressão de genes oncogênicos e supressores.
- Efeito dual – Como descrito por Kim, o folato pode exercer efeito protetor na carcinogênese inicial, mas também pode promover o crescimento de tumores já iniciados.
- Genética individual – Polimorfismos como o C677T no gene MTHFR alteram a eficiência do metabolismo do folato, modulando o risco de CCR (Kono & Chen, 2005).
A ingestão de folato por meio da dieta está consistentemente associada à redução do risco de CCR, conforme evidenciado por Gibson et al. (2011) e Xu et al. (2021). Em contrapartida, a suplementação excessiva, como apontado por Ebbing et al. (2009) e Vollset et al. (2013), pode representar risco adicional em indivíduos com lesões silenciosas.
O folato alimentar exerce um papel protetor importante contra o câncer colorretal, especialmente quando consumido por meio de alimentos naturais. Por outro lado, a suplementação excessiva e prolongada deve ser avaliada com cautela, dada a possibilidade de efeitos adversos.
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