Caracterização de parâmetros para análise de medidas objetivas da sucção não-nutritiva de recém-nascidos
Estudo realizado por Bárbara Generoso Santos de Matos Sales, Renata Maria Moreira Moraes Furlan, Camila Alexandra Vilaça Ramos, Narciso Sena Fracaroli, Estevam Barbosa de Las Casas, Andréa Rodrigues Motta
Departamento de Fonoaudiologia, Faculdade de Medicina, Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG
Recém-nascidos a termo sem alterações devem possuir a capacidade de se alimentar por via oral sem comprometer suas funções vitais. Para isso, é essencial a coordenação entre sucção, deglutição e respiração, além de características como vedamento labial, movimentos adequados da língua e mandíbula, ritmo de sucção e pausas. Existem dois tipos de sucção: a não-nutritiva (SNN), que ocorre sem a introdução de líquido na cavidade oral, e a nutritiva (SN), na qual o bebê suga o líquido do seio materno ou outro recipiente para se alimentar. Ambos os tipos compartilham parâmetros como padrão, taxa, ritmo e pressão da sucção, mas diferem em surtos e pausas.
A sucção não-nutritiva é uma habilidade essencial para a maturação e desenvolvimento do recém-nascido, trazendo benefícios como redução da dor durante procedimentos clínicos, diminuição do choro e estímulo à musculatura oral. Além disso, a SNN melhora a função motora gástrica, facilitando o ganho de peso e reduzindo o tempo de internação hospitalar. Essa função também prediz a prontidão do bebê para a alimentação oral. No entanto, fatores como prematuridade, alterações neurológicas e malformações craniofaciais podem comprometer esse comportamento, causando dificuldades na alimentação e afetando o desenvolvimento das funções estomatognáticas.
No Brasil, o fonoaudiólogo é o profissional responsável pela avaliação e treinamento da SNN, mas há poucos protocolos e escalas para uso clínico. Métodos qualitativos, como NEIVA, NOMAS, FUGINAGA e XAVIER, avaliam o comportamento motor oral dos bebês por meio da observação descritiva e categórica, mas suas respostas podem variar conforme a experiência do avaliador. Já os estudos quantitativos sobre a sucção são escassos e focam majoritariamente na sucção nutritiva, sem detalhar a análise dos dados captados pelos equipamentos de medição. Diferentes abordagens já foram utilizadas, como julgamentos maternos, comparações entre observadores e o uso de softwares como o Matlab® para processamento de sinais biológicos.
Diante da necessidade de um método sistematizado para análise da sucção não-nutritiva, o Grupo de Engenharia Biomecânica da Universidade Federal de Minas Gerais propôs um sistema de medição para auxiliar na avaliação clínica dessa função. Entretanto, além do desenvolvimento do equipamento, é essencial definir parâmetros de análise e estabelecer uma metodologia padronizada para sua utilização. Um método quantitativo confiável representaria um avanço científico na fonoaudiologia, permitindo avaliações objetivas e facilitando a tomada de decisões terapêuticas. Assim, o presente estudo teve como objetivo propor uma metodologia para análise dos dados gerados por um instrumento de medição da pressão da sucção não-nutritiva em recém-nascidos.
O estudo é do tipo observacional analítico, com delineamento transversal, e utilizou dados coletados na pesquisa de Ramos (2016), previamente aprovada pelo Comitê de Ética. Foram selecionados recém-nascidos a termo com estruturas e funções sensório-motoras orais íntegras, sem alterações neurológicas ou craniofaciais, e em aleitamento materno exclusivo. Os responsáveis assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
Os bebês foram avaliados por um profissional experiente, utilizando dois métodos: um protocolo qualitativo da sucção não-nutritiva (SNN) e uma avaliação objetiva com um instrumento de medição. A avaliação qualitativa foi realizada com o dedo mínimo enluvado da pesquisadora na cavidade oral do bebê por dois minutos. Em seguida, o mesmo procedimento foi repetido com a ponta probatória do instrumento de medição para captar a pressão de sucção. Cada bebê passou por três medições, com duração de dois minutos cada e intervalos de dois minutos para descanso.
Os critérios de inclusão exigiam que os bebês apresentassem pressão de sucção adequada na avaliação subjetiva. Os critérios de exclusão incluíam choro ou irritação durante a avaliação, ausência de sucção e interferências nos registros, como ruídos repetidos ou duplicação de traçados. Após a aplicação desses critérios, a amostra final foi composta por 24 recém-nascidos (62,5% meninos e 37,5% meninas), com média de 19,5 horas de vida e peso médio ao nascer de 3.307,08 gramas.
Para análise dos dados, foi necessário definir um limiar de pressão que distinguisse sucções reais de interferências. Esse limiar foi calculado somando a média da pressão de sucção ao desvio padrão do sinal. Eventos de sucção próximos foram considerados independentes se ambos ultrapassassem o limiar estabelecido. A partir disso, foram definidos os parâmetros analisados, como número de grupos de sucção, número de sucções por grupo, tempo para início da sucção, duração dos grupos e tempo de pausa entre sucções.
O instrumento de medição utilizado era composto por uma ponta probatória conectada a um sensor de vácuo, que captava a pressão negativa e transmitia os dados para análise digital. O sensor foi calibrado no Laboratório Isaac Newton, garantindo precisão na medição. As coletas foram realizadas no Hospital Sofia Feldman, com um total inicial de 30 bebês, reduzidos a 24 após a aplicação dos critérios de exclusão.
Para a análise, foi estabelecido um limiar de pressão para distinguir sucções reais de interferências, calculado pela média da pressão somada ao desvio padrão. Sucções próximas foram consideradas eventos independentes se ambas ultrapassassem esse limiar.
Foram definidos 12 parâmetros, incluindo número e frequência de sucções, tempo de pausas e valores de pressão mínima, média e máxima. A análise dos dados foi realizada com um programa em Matlab®, utilizando um filtro de Resposta Finita ao Impulso (FIR) para identificar picos e variáveis de interesse. Os resultados foram organizados no Excel e analisados no SPSS (versão 21.0), aplicando testes estatísticos não paramétricos de Friedman e Wilcoxon para comparação entre coletas, além do coeficiente de correlação intraclasse (CCI) para verificar a concordância entre análises manuais e automatizadas.
A análise revelou que a maioria dos recém-nascidos nasceu de parto normal (75,0%), iniciou a sucção facilmente (70,8%), apresentou força (70,8%) e ritmo (66,7%) adequados, e não demonstrou sinais de estresse (83,3%).
As Tabelas 1 e 2 apresentam medidas de tendência central e dispersão das variáveis relacionadas aos eventos de sucção, pressão e pausas. A Tabela 3 compara essas variáveis entre os três momentos de coleta, evidenciando associações estatisticamente significativas pelos testes de Friedman e Wilcoxon. A Tabela 4 mostra a concordância entre as análises manual e computadorizada, com coeficiente de correlação intraclasse (CCI) indicando concordância quase perfeita para todas as variáveis.
O estudo analisou dados da pesquisa primária sobre a avaliação da sucção não-nutritiva (SNN) em recém-nascidos, comparando variáveis da avaliação subjetiva e três coletas quantitativas.
Os parâmetros analisados, como número de sucções, grupos de sucção, pausas e pressão exercida, foram definidos com base em estudos prévios e escalas qualitativas validadas. Em relação às sucções, a segunda coleta apresentou maior número de eventos, seguida por uma leve queda na terceira, sugerindo um padrão de recuperação após repouso. O tempo para iniciar os grupos de sucção foi menor na segunda coleta, indicando melhor desempenho, enquanto a terceira coleta demonstrou uma leve retomada em relação à primeira.
A análise reforça a importância da mensuração objetiva desses parâmetros para compreender o desenvolvimento e a maturação da sucção em recém-nascidos.
O estudo analisou a sucção não nutritiva (SNN) em recém-nascidos a termo saudáveis, registrando as medições por 12 minutos e dividindo os dados em três períodos de quatro minutos. Observou-se que neonatos com menos de 24 horas de vida apresentaram maior duração dos grupos de sucção, com um padrão mais variável do que aqueles com dois ou três dias. Além disso, a frequência de sucção aumentou progressivamente entre coletas, enquanto o período diminuiu, comportamento já descrito na literatura. A amplitude e a duração dos grupos de sucção foram influenciadas por fatores como idade gestacional, estado de atividade e experiência do RN, destacando a importância de avaliar esses parâmetros em diferentes condições.
A análise da pressão de sucção revelou que os valores médios das pressões mínimas e máximas estiveram próximos aos relatados em outros estudos, embora variações tenham sido observadas. Em alguns casos, os RNs apresentaram pressões elevadas sem pausas respiratórias, o que pode impactar o desempenho na amamentação. A forte sucção foi associada a dor nos mamilos das lactantes, especialmente quando o bebê iniciava a sucção com mais fome. Fatores como adaptação do controle motor oral, estado comportamental e fome podem influenciar os padrões de sucção. Além disso, métodos diferentes de medição podem gerar variações nos resultados, ressaltando a necessidade de padronização para uma avaliação mais precisa do desempenho neonatal.
A análise das pausas na sucção revelou que a segunda coleta apresentou um maior número de pausas, o que era esperado devido ao aumento do número de grupos de sucção. Entretanto, o tempo total das pausas foi menor, pois a sucção ocorreu por períodos mais longos. O ritmo da sucção, caracterizado por alternâncias entre sucções e pausas, é fundamental para a eficiência da alimentação neonatal. Além disso, a pesquisa destacou que alterações anatômicas, como no frênulo lingual, podem influenciar esse ritmo. A maturação e a experiência do recém-nascido também desempenham um papel na redução da duração das pausas ao longo do tempo.
Em relação às sucções esporádicas, a segunda coleta registrou um número significativamente menor, sugerindo um padrão mais organizado. Essa variável, embora não tenha diferido entre as coletas no presente estudo, pode ser um parâmetro relevante para bebês de risco.
A comparação entre os três momentos de coleta mostrou diferenças significativas entre a primeira e a segunda, bem como entre a segunda e a terceira, mas não entre a primeira e a terceira, sugerindo que a segunda coleta reflete um melhor desempenho. Os achados indicam um maior preparo para a sucção nessa fase, com maior estabilidade da pressão e do ritmo de sucção. A análise computacional dos parâmetros revelou alta concordância entre os métodos manual e automatizado, demonstrando a eficácia do software baseado no Matlab®, que reduziu o tempo de análise de uma hora para um minuto por gráfico.
A padronização da avaliação da sucção não nutritiva pode contribuir para a prática clínica e a capacitação profissional, auxiliando no monitoramento do desenvolvimento neonatal. Entre as limitações do estudo estão o tamanho amostral reduzido e a ausência de variáveis como idade gestacional e sexo. Para futuras pesquisas, sugere-se aprimorar o design do aparelho, analisar a fadiga ao longo das medições e incluir registros visuais para comparação entre análises subjetivas e objetivas.
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